terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

FOLHAS   AO   VENTO
terceira viagem


Diálogo com Rainer Maria Rilke às  voltas com os Sonetos a Orfeu
e poeticamente fora de ordem. Diálogo com outros poetas.


12

Deseja ser outro: transformar-se. Que a chama te entusiasme
Onde algo te escape e seja o sinal da raiz  da transformação.
O espírito da criação, o mestre da Terra
No desejo da imagem ama, mais que tudo, o ponto da mudança.

O que está preso no que permanece já é da pedra e já é pedra,
Acaso se crê seguro, abrigado nas mãos de uma queda invisível?
Espera: a dureza mais densa e amarga adverte ao que dura
E, então, é aí que o martelo ausente ensaia o gesto e quebra.

Aquele que jorra como a fonte, o reconhecimento o acolha
E o guia feliz de ser através da criação pacificada
Ele, que como a fonte das origens se revê e recomeça a cada dia.

Todo lugar de ventura é filho ou filho da filha da ruptura
E é através dela que eles, perplexos, atravessam. E Dafne como raízes,
Como o loureiro, deseja que tu te transformes em vento.









14

Veja as flores e o ser tão fiel à terra
A quem damos um destino à beira do destino.
Mas, quem saberá? Quando elas pranteiam o morrer
Somos nós aqueles por quem elas choram?

Tua deseja voar. Com peso nos pés  andamos no mundo.
Pesamos sobre tudo e com o pesar nos encantamos.
Ah! Que senhores da fartura não somos nós para tudo
Só porque há em tudo a fortuna de nossa distante infância.

Flores. Se alguém as quisesse  para o silêncio do sono e nele dormisse
Profundamente, entre as coisas – como então amanheceria leve
E diferente num outro dia, ao chegar a uma tal profundidade  do sentir

Ou talvez por lá ficasse. E as flores floresceriam de louvar
Aquele que se converteu e agora parece haver aprendido a ser
Como todas elas, as irmãs silenciosas dos ventos do prado.




Hilda Doolittle

Amei teu corpo, ele disse
e, “ah, esse sofrer, essa falta
e a mão afaga a pele de outra mão
e dói no rosto o sol
e dói no outono a minha dor
porque todo o fruto amarga o gosto
da boca sem teu beijo, amor”.

Onde? Quando?


Rilke
Fragmento da Elegia de Duino - nove

Juizes, ah vós, de grandes togas de cor escura
Não vos vanglorieis da tortura esquecida agora,
e nem do não afastar mais os corpos com panos e atar a dor ao pescoço.
Nenhum coração algum dia foi mais grande  apenas
porque um esgar de amor, um espasmo de doçura
nos desarma o corpo com maior suavidade.

O que foi conquistado no fluir do tempo, o cadafalso
trás outra vez à cena, tal como fazem as crianças com os brinquedos
ganhos na alegria do aniversário passado há sete dias.

A doçura chegaria diferente. Ela viria no poder
e lançaria trovões maiores para todos os lados
assim como são os deuses. Sabes? Os deuses...
Mais ainda do que um grande vento
sobre as velas dos grandes navios.

Não menos. Não menos do que a lua e a secreta intuição
Que nos conquista no íntimo, em silêncio
Como um filho de um amor sem fim, brincando no meio do silêncio.

Paris, 8 de novembro de 2006





T. S. Eliot


Rumo ao mar eu os vejo, cavalgando ondas

Penteando as suas longas crinas brancas e encrespadas
Quando o vôo do vento revolve
águas negras e águas brancas.
Nós dois no abandono ficamos
Nas mansões  do mar, sua morada
Entre ondinas e véus de algas claras e cor de púrpura.

Até quando outras vozes de homens nos despertem

E, então, morreremos naufragados.

Tradução livre e criativa da penúltima páginas do
A canção de amor e morte de J. Alfred Prufrock
De T.S. Eliot





Um comentário:

  1. "O que está preso no que permanece já é da pedra e já é pedra"

    VERDADE! E JESUS SENDO A ROCHA ETERNA e nosso fundamento da Belezura seria muito bom que nós todos, numa alegoria à VIDA, fôssemos os petros, os pedacinhos dESTA ROCHA ÚNICA...

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